Centro de documentação
e arquivo feminista
elina guimarães

Memórias e Feminismos II
Novos olhares, outras vozes

Introdução

A apresentação do projeto “Memórias e Feminismos II – Novos olhares, outras vozes” surge na sequência do acolhimento muito positivo por parte das pessoas envolvidas no anterior projeto, mostrando que o trabalho em torno das histórias de vida tem enormes potencialidades para a preservação da memória histórica dos feminismos e para a investigação histórica, sociológica e antropológica.

A UMAR desenvolveu entre Dezembro de 2012 e Julho de 2013 o Projeto “Memórias e Feminismos: percursos de vida de mulheres no século XX em Portugal”, centrado nas regiões do Minho e Madeira. Foram realizadas em cada região 10 entrevistas a mulheres de diversos setores sociais, após seleção prévia segundo critérios definidos pelo Conselho Consultivo do Centro de Documentação e Arquivo Feminista Elina Guimarães, da UMAR, ao qual este projecto esteve ligado. Para cada região foi elaborado um vídeo com as entrevistadas e, posteriormente, um vídeo final englobando as mulheres das duas regiões. São testemunhos pungentes de mulheres cujas lutas ajudaram a mudar a vida de outras mulheres; de mulheres que apesar de todas as adversidades, conseguiram autonomizar-se e ganhar poder sobre si próprias; outras ainda, passaram por vivências de dor e sofrimento cujas lutas pessoais não as desarmaram, resistindo com tenacidade. Todas elas são testemunho de vozes que se perdem no tempo – invisíveis. A todas elas foi-lhes dada a voz, que lhes é negada numa sociedade baseada num registo patriarcal de profundo apagamento da memória das mulheres ao longo de séculos.

No âmbito deste projeto realizaram-se seminários, subordinados ao tema “As histórias de vida e a memória histórica dos feminismos”, onde foram apresentados os vídeos com as entrevistas sobre percursos de vida realizados pelas equipas no terreno. Ainda no âmbito deste projeto foi organizada a conferência final “Preservar a memória histórica dos feminismos: a importância histórica dos arquivos”, onde participaram os/as historiadores/as e investigadores/as: Anne Cova, Helena Neves, Irene Pimentel, Maria Augusta Seixas, Rui Bebiano e Zília Osório de Castro. Esta conferência contou ainda com a participação do diretor da Hemeroteca Municipal de Lisboa – Álvaro de Matos, do sub diretor do Arquivo Nacional da Torre do Tombo – Silvestre Lacerda e do Diretor da Biblioteca e Arquivo da Fundação Mário Soares – Alfredo Caldeira. Nesta conferência considerou-se a enorme importância dos arquivos incluírem registos de história oral, uma fonte incontornável à investigação histórica, antropológica ou sociológica da contemporaneidade.

Temos consciência que as vozes e ecos de memória até agora recolhidos não passam de uma pequena amostra do muito que as mulheres têm para nos contar, ao longo deste país tão pequeno mas tão grande na diversificação de vozes e olhares que as nossas mulheres possuem e é necessário desocultar. Ao longo do desenrolar do projeto Memórias e Feminismos, fomos abordadas por muitas mulheres de outras zonas do país que manifestaram interesse em colaborar.

Todas estas vivências que passaram das entrevistadas para quem elaborou, organizou e desenvolveu este projeto, leva-nos a ponderar a urgência de lhe dar continuidade através de um novo projeto que agora apresentamos. A importância deste trabalho para a investigação em estudos sobre as mulheres, de género e feministas foi-nos também transmitida por académicas que valorizam em termos metodológicos e epistemológicos o recurso a histórias de vida.

Contexto do novo projeto

O novo projeto assentará em duas novas regiões do país: Coimbra e Setúbal, contribuindo para a preservação da memória histórica dos feminismos, pela voz de mulheres de diversos sectores sociais e faixas etárias.

Setúbal cidade onde nasceram Luísa Todi e Ana de Castro Osório, viu até meados do século XX florescer uma indústria conserveira que ocupava muitas das mulheres desta cidade. A região de Setúbal possui uma vasta orla costeira – de Cacilhas a Sines, onde muitas mulheres se dedicam à faina piscatória. Zona de charneira entre a ruralidade Alentejana e a cosmopolita Lisboa, com os seus pólos de ruralidade como os arrozais do Sado, onde mulheres trabalham de sol a sol em terrenos insalubres. Nesta região fixaram-se muitos/as migrantes vindos/as do Sul, para as fábricas que durante grande parte do século XX povoavam esta região, que fazia parte da cintura industrial de Lisboa. Mulheres que trabalharam na indústria corticeira caso da Mundet, no setor têxtil como nas Lãs da Arrentela, ou na Vestus em Corroios, bem como na indústria de componentes electrónicos, caso da Plessey. Esta região viu fixarem-se imigrantes vindos de África, do Leste Europeu, do Brasil e de outras regiões do globo.

A escolha da região de Coimbra, no seu perímetro urbano, foi equacionada por aí se entrelaçaram as histórias das estudantes do Conselho Feminino da Associação Académica de Coimbra, que na década de 1960, participaram nas lutas estudantis, com outras histórias, uma década depois, em que o Grupo de Mulheres da Associação Académica de Coimbra publicava no seu Boletim Da Mulher, entrevistas a mulheres do setor têxtil assim como de trabalhadoras despedidas da Ovícula da Pedrulha numa clara ligação entre as lutas operárias e estudantis. Nesta cidade de estudantes e de repúblicas, hoje em dia, podemos encontrar uma única República de Mulheres – Marias do Loureiro.

Objectivos

1- Recolher histórias de vida de mulheres em duas novas regiões: Setúbal e Coimbra, refletindo sobre os seus precursos de vida e diferenças identitárias.
2- Dar continuidade ao projeto iniciado na Madeira, com a divulgação dos materiais já apresentados no seminário de 14 de Junho, na Câmara Municipal do Funchal – exposição itinerante, livro de entrevistas e vídeo, em escolas, associações e organismos sociais, daquela região autónoma.
3- Elaborar e editar uma agenda feminista para 2014 baseada nas histórias de vida recolhidas na Madeira e no Minho.
4- Continuar a interagir com os responsáveis dos centros de documentação, arquivos e bibliotecas e reflectir sobre a importância das histórias de vida como metodologia para os estudos sobre as mulheres, de género e feministas.

Actividades

1- Elaboração e edição da Agenda Feminista 2014 baseada nas histórias de vida de mulheres do Minho e Madeira.
2-Selecção das mulheres a entrevistar nas duas novas regiões: Coimbra e Setúbal.
3-Realização e transcrição das entrevistas a mulheres das regiões de Coimbra e Setúbal.
4-Elaboração de vídeos por regiões e de vídeo final.
5-Realização de sessões em escolas, autarquias locais, centros de convívio da terceira idade, colectividades. Na região da Madeira serão realizados debates em diversos locais como Machico, Ponta de Sol, Câmara de Lobos e Funchal, utilizando os materiais produzidos no anterior projecto: vídeos, exposição e brochura. Os debates irão versar temas que emanam das entrevistas realizadas: Violência de Género, Violência contra Mulheres Idosas, Mulheres e Empoderamento, Pobreza com rosto de Mulher, Mulheres Ambiente e Sustentabilidade, Precariedade e Discriminação, Preconceitos de ontem e de hoje.
6-Acções de sensibilização/formação para dinamizadoras da região da Madeira em torno dos debates que serão realizados nas diversas localidades.
7-Conferência Internacional em torno das histórias de vida como metodologia para os Estudos sobre as Mulheres, de Género e Feministas.

Metodologias

De carácter qualitativo, as metodologias a utilizar caracterizam-se pela proximidade junto das mulheres cujas histórias de vida vão ser recolhidas, após selecção prévia mediante critérios estabelecidos pelo Conselho Consultivo do Centro de Documentação e Arquivo Feminista Elina Guimarães. As filmagens a realizar irão ser antecedidas de formação adequada à recolha de histórias de vida e a aspectos técnicos de som e imagem, dado que no anterior projecto esta última questão teve algumas falhas. As conferencistas delineadas para a conferência internacional irão ser um dos suportes teóricos do projecto, através de textos e publicações na área.